domingo, 7 de agosto de 2011

...nas minhas viagens alucinadas na Internet, após um suicídio no face book e um renascimento apenas para ver a pag do Gerald Thomas que sempre tem alguma notícia, me deparei com esse presente...

Depois do silêncio, uma postagem que é um arroto intelectual


Pronto, acabou a crise... tava passeando no brog do Gerald Thomas, e me inspirei a continuar estes escritos.
E ainda , num programa da TV 5, ontem , fiquei cara a cara com um Beckett que não parava de me olhar. Fui dormir com ele na cabeça e acordei pensando em escrever sobre o moço...
Samuel Beckett foi o menos sociável, o mais secreto e avesso à publicidade entre os grandes autores do século XX. Sua carreira sempre foi considerada um dos grandes enigmas no mundo das letras mesmo entre estudiosos que procuram relacionar sua vida a sua obra. No momento em que conhece a celebridade com "Esperando Godot", peça de 1949, pouco se falava do autor e poucos conheciam suas obras anteriores, que se encontravam fora dos catálogos das editoras. Mesmo após 100 anos do nascimento do mítico escritor, pouca gente sabe quais são seus livros e em que língua ele os escreveu. Poucos críticos leram seu primeiro ensaio sobre Proust, escrito em 1931, no qual Beckett afirma que o mundo nada mais é do que um incessante purgatório — um texto no qual estão lamentações que apareceriam na voz de personagens como Molly ou Malone. Além disso, poucos fãs têm conhecimento de sua primeira ficção, uma coletânea de novelas intitulada "More Pricks Than Kicks", de 1934, sem tradução no Brasil.
"No Brasil quase só se conhece Beckett como o autor de ‘Esperando Godot’. Despropositadamente, aqui, ele é ligado ao ‘Teatro do Absurdo’", diz Bebel Cavalcanti, estudosa de sua obra e autora do livro "Eu Que Não Estou Aí Onde Estou: O Teatro de Samuel Beckett /O Sujeito e a Cena Entre o Traço e o Apagamento" (editora 7 Letras).
"Beckett começou a escrever teatro no fim dos anos 40. Antes disso, já havia acumulado uma obra considerável. Sua poesia, por exemplo, é de grande valor estético e ainda assim é praticamente ignorada no Brasil. Também se ignora o fato dele Ter se inspirado nas artes plásticas para escrever suas obras", me disse Bebel numa entrevista.
Uma das maiores atrizes beckettianas de todos os tempos, a inglesa Billie Whitelaw, disse um dia que o autor irlandês não escrevia textos, mas pinturas. O próprio Beckett concordou, dizendo que a plasticidade de sua obra sempre foi mais importante do que a história propriamente dita. A peça "Eu Não" (1972), segundo o próprio autor, é inspirada na tela "A Decapitação de São João Batista", de Caravaggio. "Neste trabalho, escrito para ser montado num espaço cênico todo negro, apenas uma boca feminina é responsável pela ação. Há, no canto do palco, um ouvinte encapuzado que realiza apenas quatro movimentos. "A inspiração em Caravaggio vem do fato de que na pintura uma série de pessoas assistem à decapitação do santo. Beckett teria se utilizado de uma leitura um tanto quanto abstrata do quadro para concluir sua obra", diz Rubens Rusche, diretor teatral, tradutor de Beckett no País e professor de artes cênicas da Universidade de São Paulo (Usp).
É de Rusche a premiada montagem de "Eu Não", realizada em 1986, com Maria Alice Vergueiro. "Uma peça de difícil compressão, com texto elíptico e quase que ininteligível", diz o diretor. "Mas com plasticidade impecável".
Rusche já dirigiu a peça radiofônica "Cascando", de 1962, trabalho inédito no Brasil e um dos únicos seis realizados para o rádio. "O rádio fez com que o autor desenvolvesse textos nos quais explorasse ao máximo o limite entre a voz e o silêncio". Em ‘Cascando’ — que quer dizer decrescendo — dois personagens, o abridor (que, apesar de não ter identidade revelada no texto original, nada mais é, para Rusche, que alguém que abre canais sonoros), uma voz não identificada e uma música de fundo dialogam sobre o nada, enquanto o som vai se tornando escasso, aos poucos, e até que só reste o silêncio. "Esta peça pode muito bem ter inspirado 90% dos 19 trabalhos teatrais que o autor escreveu, todos muito breves e nos quais o silêncio é algo revelador", diz.
"‘Vai e Vem’ (1966), por exemplo, dura 10 minutos e quase que não há ação, nem diálogos. Apesar do laconismo, a precisão da obra é desconcertante. Já ‘Respiração’ (1969), seu trabalho mais curto, com 35 segundos de duração, é marcado pela inexistência de todos os objetos que se costuma ver no teatro tradicional. Neste trabalho, mesmo a plasticidade foi sublimada", diz.
Agraciado com o Nobel de literatura em 1969, o dublinense autor de fábulas que se restringem a uma banalidade — que pode ser lida como o "mal estar da civilização" —, começa sua carreira em 1928, momento em que viaja a Paris para ensinar inglês, tornando-se secretário de James Joyce.
No ano em que Beckett recebe o Nobel, o poeta conterrâneo John Montague escreve que entre os dois mestres da narrativa irlandeses havia quase que uma diferença de raça. Enquanto Joyce vinha de uma família pequeno-burguesa, Beckett nasce em meio a uma sólida estrutura protestante em Foxrock, periferia de Dublin. Mas as diferenças entre mestre e aluno não param aqui. Se Joyce busca uma linguagem rebuscada, Beckett apura seu texto até o limite da simplicidade. "Mesmo que tenha inicialmente se inspirado em Joyce, o próprio Beckett disse numa ocasião de que bastava ver os originais de ambos para se sentir a diferença de estilo. Enquanto um adicionava palavras no texto, o outro as cortava incessantemente em busca de concisão", diz Bebel Cavalcanti.
Mas o silêncio presente em sua obra foi inspirado também, conforme Beckett disse um dia, em Beethoven e em Schubert. "Ele foi alguém muito erudito, seus gostos artísticos estão todos presentes, em algum momento e de alguma forma, em sua obra", completa Bebel.
A alta filosofia também foi uma das fontes de inspiração do jovem autor. John Montague afirma que, no começo da carreira, Beckett teve um interesse quase que profissional pela filosofia, utilizando-a para apurar seu estilo. "Sua tese universitária tratou de Descartes. Ele ainda estudou Kant e Malebranche. Mas ao escrever ‘Esperando Godot’ ele enterra suas buscas metafísicas", diz o poeta.
Foi Paris a cidade mais inspiradora ao artista. É lá que Beckett faz seus estudos literários e filosóficos mais aprofundados. Foi Rudmose Bronw, um professor excêntrico e brilhante amigo de uma geração de bons poetas como Larbaud, Stuart Merril e Viélé-Griffin que o levou a conhecer André Breton e Paul Éluard, que acabam influenciando Beckett.
Em 1937, ele fixa residência na cidade, na qual restará até o fim da vida. No ano seguinte, após ser esfaqueado por um cafetão, ele revê Suzanne Deschevaux-Dumesnil, com quem havia jogado tênis dez anos antes e com quem acabaria se unindo. Seis anos mais velha que Beckett, Suzanne é uma pianista talentosa, forte e independente com interesses por literatura e pelo teatro.
Mas os tempos doces logo acabam com a declaração da segunda grande guerra. Nesta época é que, diz a lenda, ele teria dito que preferia Paris em guerra à Irlanda em paz. Três anos após fazer esta declaração, junta-se à Resistência e, em 1942, Suzanne e Beckett escapam por pouco da Gestapo. Eles deixam a Rue des Favorites, instalando-se em Roussillon, lugar no qual ele arruma um trabalho campestre. Durante o período de sua estadia rural, ele aproveita a madrugada para escrever.
Neste ponto, chega-se num momento capital da obra de Beckett, quando ele se decide a escrever em francês. Segundo o próprio, esta "é uma língua na qual é mais fácil de se trabalhar sem estilo". Críticos de sua obra dizem que, provavelmente, sua decisão foi tomada depois de ser acusado, na Irlanda, de escrever livros de gosto duvidoso.
"Se algumas de suas primeiras montagens teatrais receberam críticas negativas, hoje, quanto mais se estuda sua obra, mais se percebe a abrangência de seu trabalho", diz Rusche.
Sua produção múltipla conta até mesmo com o roteiro e a produção de um filme, chamado "Film", de 1964, que também será apresentada no festival carioca. Dirigido por Alan Schneider com atuação de Buster Keaton, a películo fez com que o autor viajasse pela primeira vez aos Estados Unidos para conselhos ao diretor, de quem Beckett ficou amigo.
Apesar de sua reclusão e de sua vida solitária, dizem que Beckett sempre foi um amigo dedicado. Gerald Thomas, um dos dramaturgos responsáveis pela divulgação da obra beckettiana no Brasil nos anos 80, é um dos que afirmam o apreço do irlandês por seus laços de amizade. Thomas diz ter mantido encontros com Beckett nos anos 80 em Paris pouco antes de sua morte (ele faleceu m 1989 meses depois da morte de Suzane). "Estava com ele em um café (é desta época a foto tirada por Daniela Thomas, em que o diretor e seu mestre se encontram num típico ambiente beckettiano, sombrio e enfumaçado) no momento em que ele, consternado, recebe uma carta postada três dias antes e assinada por Schneider", diz. Quando a carta chega às mãos de Beckett, o diretor de "Film" já estava morto. Ele havia sido atropelado a caminho do correio, no momento em que iria postar a correspondência ao amigo. Thomas discorre sobre o fato lúgubre na peça "Asfaltaram o Beijo" — uma de suas últimas produções que esteve em cartaz há um ano e pouco em São Paulo.
Pronto. Obrigado Thomas.
Love
A


Nenhum comentário: