terça-feira, 9 de agosto de 2011

O cinema e a estética de Gerald Thomas


 




 
       
 
 

















 
Thomas, Gerald (1954)

Biografia
Geraldo Thomas Sievers (Rio de Janeiro RJ 1954). Diretor. Polêmico encenador, criador de uma estética elaborada a partir do uso diferenciado de cada um dos recursos teatrais e orientada pelo conceito de "ópera seca", Gerald Thomas renova a cena brasileira nas décadas de 1980 e 1990.
A carreira de Gerald Thomas tem início em Londres, onde participa do grupo performático e multimídia Exploding Galaxy. No grupo amador Hoxton Theatre Company, realiza suas primeiras experiências como diretor. Vai para Nova York, e trabalha no La MaMa, espaço dedicado a encenações experimentais de todo o mundo, onde produz três espetáculos consecutivos, com textos de Samuel Beckett. Desde o primeiro projeto, Thomas visa uma proposta teatral, na qual a identificação emocional seja suprimida, dedicando-se a mostrar o pensamento como processo, e o processo como tempo e espaço da cena.
Os dois primeiros espetáculos que o diretor encena no Rio de Janeiro são remontagens. Quatro Vezes Beckett, 1985, em que acrescenta o texto Nada à Trilogia Beckett, e Quartett, 1986, em que retoma o texto de Heiner Müller, ambos com um ano de intervalo em relação à montagem americana. Com o primeiro, interpretado por Rubens Corrêa, Sergio Britto e Ítalo Rossi, numa produção do Teatro dos Quatro, recebe o Prêmio Molière. O segundo tem no elenco Tônia Carrero e, novamente, Sergio Britto. Em Carmem com Filtro, 1986, o diretor utiliza texto de sua autoria para o espetáculo, protagonizado em São Paulo por Antonio Fagundes e Clarisse Abujamra, numa produção da Companhia Estável de Repertório - CER. O espetáculo e sua direção recebem o Prêmio Mambembe. No mesmo ano, cria um novo espaço cênico no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro - MAM/RJ, e encena Eletra Com Creta, espetáculo radical e controverso, no qual, por meio e telas e luz, cria um efeito de edição cinematográfica.
Funda, em 1986, a Companhia de Ópera Seca, onde solidifica sua dramaturgia paródica e desconstrutivista. O texto, vinculado ao momento da cena, não obedece uma forma estática e se estabelece, muitas vezes, a partir de frases e comentários. Elemento recorrente de suas produções, a voz gravada do diretor comenta, em off, a ação. Em alguns espetáculos essa função se duplica, o protagonista funciona como um porta-voz do diretor. A trajetória de Gerald Thomas como diretor está também marcada por longas parcerias, com a cenógrafa Daniela Thomas, criando ambientes hipotéticos e mutáveis, como a biblioteca da Trilogia Kafka, e com a atriz Bete Coelho, protagonista de seguidas encenações, admirada por sua capacidade de sintetizar em sua atuação o exagero e a crítica, a dramaticidade e o distanciamento, princípios cênicos da interpretação valorizados pelo diretor. A Trilogia Kafka, 1988, uma interpretação livre dos textos do escritor theco Franz Kafka, encenada em São Paulo, confere ao diretor o Prêmio Molière. A pesquisadora Sílvia Fernandes analisa o papel preponderante da luz na encenação, segundo o qual "a iluminação transformava o espaço cênico num lugar mutante, onde as cenas curtas eram decupadas pela rapidez dos cortes bruscos, resultando em imagens intermitentes que lembravam filmes do princípio do século".1
Em 1989, estréiam Carmem com Filtro 2 e Mattogrosso, ópera assinada pelo diretor em parceria com o músico Philip Glass. Thomas volta a Beckett encenando Fim de Jogo, em 1990. No mesmo ano, encena M.O.R.T.E., onde Bete Coelho, que faz seu último espetáculo na companhia, encarna o próprio autor do espetáculo, como criador e criatura da cena que anima. Fernanda Torres assume o papel central dos três espetáculos seguintes: The Flash and Crash Days - Tempestade e Fúria, 1991, ao lado da mãe, a atriz Fernanda Montenegro, O Império das Meias Verdades, 1993, e UnGlauber, 1994. Em Nowhere Man, 1996, Luiz Damasceno protagoniza a versão de Thomas para o mito do homem que faz um trato com o Diabo, vendo em Fausto o artista que troca a alma pela fama. Ao remontar Quartett, ainda 1996, com Edilson Botelho e Ney Latorraca, transforma os dois personagens em açougueiros e os coloca em uma câmara frigorífica para abordar os limites de sobrevivência da espécie humana. Em 1997, estréia Os Reis do Iê-Iê-Iê, no Festival de Curitiba. No mesmo ano, em Belo Horizonte, encena A Breve Interrupção do Fim, com o Grupo de Dança 1º Ato. Em 1999, cria Ventriloquist, uma metáfora para a polifonia do discurso e, no ano seguinte, Tragédia Rave. Em 2000, estréia NxW (Nietsche x Wagner), e Esperando Beckett. O Príncipe de Copacabana e Deus Ex-Machina são montados em 2001 e, em 2003, encena Tristão e Isolda, de Richard Wagner, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Paralelamente às estréias brasileiras, Gerald Thomas encena espetáculos em outros países, principalmente na Alemanha.
Para o filósofo Gerd Bornheim, Gerald Thomas representa, no campo das discussões teatrais, mais do que um propositor de estéticas, mas "um pensador prático criador de uma Poética, ou seja, de um modo de produzir o novo".2
No último capítulo do livro que escreve sobre a obra do encenador, a pesquisadora Sílvia Fernandes conclui: "Sem território fixo, com espaço que se subleva à intervenção da luz, com a música impactante que desnorteia os sentidos, com os retalhos de personagens arrastados pelo ator com o narrador que é também encenador e, como ele, se recusa à narrativa, com os corpos de leitmotive seccionando a cena em minúsculas veias sentindo, com movimento construtivo em progresso, que leva o espetáculo seguinte a negar o anterior, a encenação de Thomas transforma o espectador em parceiro de um jogo libertário, feito sem regras fixas. Compõe um anteparo subversivo ao desejo, demasiado humano, de totalização".3
Notas
1. FERNANDES, Sílvia. Memória e invenção: Gerald Thomas em cena. São Paulo: Perspectiva, 1996. p. 23.
2. BORNHEIM, Gerd. In: CARMEM COM FILTRO 2. Direção Gerald Thomas; texto Gerd Bornheim. Rio de Janeiro, 1989. 1 folder. Programa do espetáculo, apresentado em 1989.
3. FERNANDES, Sílvia. Memória e invenção: Gerald Thomas em cena. São Paulo: Perspectiva, 1996. p. 298-299.


Atualizado em 25/09/2009

Nenhum comentário: