segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Teatralidade Digital

Aparelho de superar ausências



O Phila7 – grupo liderado por Rubens Velloso e um dos pioneiros no trabalho com digital no país – está promovendo um seminário bastante interessante em São Paulo chamado “Aparelho de Superar Ausências“ .
O objetivo das atividades é trabalhar as relações entre a cena teatral com as novas tecnologias e discutir sobre como incorporar no teatro as novas formas midiáticas que vêm transformando a condição humana.
A programação está dividida em dois momentos: nos meses de março e abril acontece os seminários e no final de abril e começo de maio os workshops.
O primeiro ciclo de debates, “A Noção do espaço no contemporâneo”, começou ontem e vai até 7 de março. Só tem gente boa: segunda 4/3 Giselle Beiguelman, terça 5/3 Fernando Iazetta, quinta 7/3 Laymert Garcia dos Santos – e na quarta 6/3 eu, honrado de estar no meio de gente que muito admiro, a falar sobre o Efêmero Revisitado e a relação teatro e cultura digital.
A ideia é fazer uma grande roda de debates com os 10 selecionados pra oficina, o pessoal do Phila7 e outros convidados. Minha fala vai tentar centrar em dois aspectos: a presença e a imersão.
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Na primeira parte, vou falar um pouco dos “regimes” de presença (virtual, física, mental) e do quanto ela “não é fruto apenas da percepção, mas do desejo de ver”, como diz o alemão Hans-Thies Lehman, teórico do pós-dramático. A partir daí, nesta parte quero ainda trazer a fala de Renato Ferracini presente no livro, em que ele trata da presença como uma relação de jogo; se você cria uma relação num espaço de jogo com o público, não importa se é vídeo, on ou offline. Nesse sentido, como conclui o ator, diretor e professor da Unicamp, “qualquer outra linguagem que advenha de uma relação tecnológica tem que, assim como o ator, se diluir e propor o jogo, não impor”.
O desafio dos grupos e cias. de hoje é proporcionar que esta tecnologia entre e proponha o jogo de modo convincente com os atores/espectadores, algo que tentarei mostrar como se dá através dos exemplos usados no livro – o Teatro para Alguém, Teatro Oficina, o próprio Phila7 – e outros que surgiram depois da publicação, casos dos espetáculos de Márcio Meirelles no Teatro Vila Velha (especialmente “O Olho de Deus“), Kollwisztrasse52, de Esmir Filho, e Julia, de Christiane Jatahy.
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No segundo momento, vou entrar na ideia de imersão, desde sempre presente no teatro, e relacionar com os jogos digitais. Como diz a pesquisadora Janet Murray em Hamlet no Holodeck:
À medida que o mundo virtual ganhar uma expressividade crescente, nós nos acostumaremos lentamente a viver num ambiente imaginário que, por enquanto, achamos assustadoramente real. Então, não estaremos mais interessados em saber se os personagens com quem interagimos são atores roteirizados, companheiros de improvisação ou chatterbots computadorizados, nem continuaremos a refletir sobre se o lugar que ocupamos existe como uma fotografia de um cenário teatral ou como um gráfico gerado por computador, ou se ele chega até nós através de ondas de rádio ou por fios telefônicos. A essa altura, quando o próprio meio dissolver-se em transparência, estaremos perdidos no faz-de-conta e interessados apenas na história. Não vamos nos dar conta disso quando acontecer, masnaquele momento – ainda que sem os sintetizadores de matéria – nós nos sentiremos à vontade no holodeck
A questão que se propõe, então, é se não seria uma realidade próxima imaginar que um espectador vá ao teatro e lá, em vez de se sentar em sua poltrona à espera da peça, seja convidado a interpretar um dos personagens da montagem num poderoso simulador 3D, onde o “avatar” a ser assumido já foi treinado durante meses para realizar aquela função e está com todo o espetáculo “decorado”, bastando ao usuário/espectador apenas colocar suas idiossincrasias no “jogo” que se dará a partir da narrativa da peça? Seria isso ainda teatro ou um jogo?
Pra além das definições, o fato é que a evolução crescente da tecnologia digital estará em breve a tornar esse tipo de peça realidade -se já não é em alguns lugares e ainda não sabemos. Numa sociedade afeita a colaboração como a de hoje, não à toa vivemos quase o que alguns chamam de “gamificação” da vida. Vivemos em uma época de pessoas multitarefa, que leem um artigo como este e na mesma velocidade os escrevem e se esquecem de que um dia fizeram tudo isso. Como envolver um público com esse perfil e conseguir extrair o precioso minuto de sua atenção? Transformar em jogos uma ação corriqueira é uma das melhores opções. Seria o tipo de interação proporcionada pelos games desejável também no teatro?
A ideia é trazer como exemplo o “teatro-game” Incubadora, dirigido por Ivan Andrade, espetáculo que faz os espectadores interferirem (ou brincarem) com os três personagens através de celulares conectados a uma rede interna.
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Ao final, esse esboço quer se tornar um ensaio, a também ser publicado aqui. Torcemos e aguardemos.
L.
P.s: O evento vai ser transmitido em streaming aqui.

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