Teatralidade Digital
Aparelho de superar ausências
O Phila7
– grupo liderado por Rubens Velloso e um dos pioneiros no trabalho com
digital no país – está promovendo um seminário bastante interessante em
São Paulo chamado “Aparelho de Superar Ausências“ .
O objetivo das atividades é trabalhar as
relações entre a cena teatral com as novas tecnologias e discutir sobre
como incorporar no teatro as novas formas midiáticas que vêm
transformando a condição humana.
A programação está dividida em dois momentos: nos meses de março e
abril acontece os seminários e no final de abril e começo de maio os
workshops.
O primeiro ciclo de debates, “A Noção do
espaço no contemporâneo”, começou ontem e vai até 7 de março. Só tem
gente boa: segunda 4/3 Giselle Beiguelman, terça 5/3 Fernando Iazetta, quinta 7/3 Laymert Garcia dos Santos
– e na quarta 6/3 eu, honrado de estar no meio de gente que muito
admiro, a falar sobre o Efêmero Revisitado e a relação teatro e cultura
digital.
A ideia é fazer uma grande roda de
debates com os 10 selecionados pra oficina, o pessoal do Phila7 e outros
convidados. Minha fala vai tentar centrar em dois aspectos: a presença e a imersão.
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Na primeira parte, vou falar um pouco dos
“regimes” de presença (virtual, física, mental) e do quanto ela “não é
fruto apenas da percepção, mas do desejo de ver”, como diz o alemão
Hans-Thies Lehman, teórico do pós-dramático. A partir daí, nesta parte
quero ainda trazer a fala de Renato Ferracini
presente no livro, em que ele trata da presença como uma relação de
jogo; se você cria uma relação num espaço de jogo com o público, não
importa se é vídeo, on ou offline. Nesse sentido, como conclui o ator,
diretor e professor da Unicamp, “qualquer outra linguagem que advenha de
uma relação tecnológica tem que, assim como o ator, se diluir e propor o
jogo, não impor”.
O desafio dos grupos e cias. de hoje é
proporcionar que esta tecnologia entre e proponha o jogo de modo
convincente com os atores/espectadores, algo que tentarei mostrar como
se dá através dos exemplos usados no livro – o Teatro para Alguém, Teatro Oficina,
o próprio Phila7 – e outros que surgiram depois da publicação, casos
dos espetáculos de Márcio Meirelles no Teatro Vila Velha (especialmente “O Olho de Deus“), Kollwisztrasse52, de Esmir Filho, e Julia, de Christiane Jatahy.
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No segundo momento, vou entrar na ideia
de imersão, desde sempre presente no teatro, e relacionar com os jogos
digitais. Como diz a pesquisadora Janet Murray em Hamlet no Holodeck:
À medida que o mundo virtual ganhar
uma expressividade crescente, nós nos acostumaremos lentamente a viver
num ambiente imaginário que, por enquanto, achamos assustadoramente
real. Então, não estaremos mais interessados em saber se os personagens
com quem interagimos são atores roteirizados, companheiros de
improvisação ou chatterbots computadorizados, nem continuaremos a
refletir sobre se o lugar que ocupamos existe como uma fotografia de um
cenário teatral ou como um gráfico gerado por computador, ou se ele
chega até nós através de ondas de rádio ou por fios telefônicos. A essa
altura, quando o próprio meio dissolver-se em transparência, estaremos
perdidos no faz-de-conta e interessados apenas na história. Não vamos
nos dar conta disso quando acontecer, masnaquele momento – ainda que sem
os sintetizadores de matéria – nós nos sentiremos à vontade no holodeck
A questão que se propõe, então, é
se não seria uma realidade próxima imaginar que um espectador vá ao
teatro e lá, em vez de se sentar em sua poltrona à espera da peça, seja
convidado a interpretar um dos personagens da montagem num poderoso
simulador 3D, onde o “avatar” a ser assumido já foi treinado durante
meses para realizar aquela função e está com todo o espetáculo
“decorado”, bastando ao usuário/espectador apenas colocar suas
idiossincrasias no “jogo” que se dará a partir da narrativa da peça?
Seria isso ainda teatro ou um jogo?Pra além das definições, o fato é que a evolução crescente da tecnologia digital estará em breve a tornar esse tipo de peça realidade -se já não é em alguns lugares e ainda não sabemos. Numa sociedade afeita a colaboração como a de hoje, não à toa vivemos quase o que alguns chamam de “gamificação” da vida. Vivemos em uma época de pessoas multitarefa, que leem um artigo como este e na mesma velocidade os escrevem e se esquecem de que um dia fizeram tudo isso. Como envolver um público com esse perfil e conseguir extrair o precioso minuto de sua atenção? Transformar em jogos uma ação corriqueira é uma das melhores opções. Seria o tipo de interação proporcionada pelos games desejável também no teatro?
A ideia é trazer como exemplo o “teatro-game” Incubadora, dirigido por Ivan Andrade, espetáculo que faz os espectadores interferirem (ou brincarem) com os três personagens através de celulares conectados a uma rede interna.
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Ao final, esse esboço quer se tornar um ensaio, a também ser publicado aqui. Torcemos e aguardemos.
L.
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