sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Homenagem ao Vamp - Volte querido!!


___"Estado, chamo eu, o lugar onde todos, bons ou malvados, são bebedores de veneno; Estado, o lugar onde todos, bons ou malvados, perdem-se a si mesmos; Estado, o lugar onde o lento suicídio de todos chama-se... "vida"!" (F. Nietzsche)

Bate-papo com Gerald Thomas

Sejam todos bem-vindos!



Gerald Thomas (Imagem da Internet)

Neste primeiríssimo post do “Blog do Vamp” entrevisto o autor e diretor de teatro Gerald Thomas (http://www.geraldthomas.com/). De Londres, onde se encontra a trabalho, Gerald comenta sobre vários assuntos nesta nossa primeira conversa. Outras virão. A entrevista, realizada por e-mail, foi concedida neste final de semana (7 e 8 de Novembro). Vamos a Gerald Thomas:

O Vampiro de Curitiba (Vamp): Bom dia, meu querido! Até pouquíssimo tempo você tinha um blog hospedado no portal IG. Apesar da enorme participação de leitores, o que fez do seu blog um sucesso absoluto naquele portal, o blog foi "fechado". Em que circunstâncias se deu sua saída do IG?

Gerald Thomas (GT): Bom, Vamp, o Blog era teu também. Sobre as questões do IG, prefiro não falar ainda. Ou melhor, acho que não posso, não devo, já que estou contratado ainda por 90 dias. Mas sim, o blog era e ainda é um sucesso, já que (nostalgicamente) eu entro lá no sitemeter e percebo que tem sempre gente online (mínimo 20, máximo 30, sem anúncio, sem chamada, sem nada) e aos poucos chegaremos a um milhão... Número esse que teríamos alcançado se o artigo/carta pro Woody Allen (pedindo que ele não filmasse no Rio, a capital dos traficantes e da violência urbana), não fosse completamente "escondida" dentro do portal. Mas entendo que os interesses do portal mudaram e seus novos donos estão interessados num novo conteúdo. Isso é normal.




Vamp: Eu entendo. Realmente foi desanimador a forma patética como as coisas aconteceram, mas isso é passado. Falando em passado, nesta segunda-feira próxima os amantes da liberdade em todo mundo festejarão os vinte anos da queda do Muro de Berlim. Foi um acontecimento que marcou a vida de milhões de pessoas, inclusive a sua, muito especificamente, né?

GT: Vai ser um dia triste e muito alegre. Um gosto agridoce, já que eu "surfava" aquela bosta de muro (PIOR símbolo que o ser humano é capaz de construir). Eu tinha família dos dois lados: na DDR, ou seja, na Alemanha Oriental, onde as filas pra uma fatia de pão eram gigantescas, e ainda tenho família em Berlim Ocidental (com seus luminosos capitalistas virados pra Alexander Platz). Eu estava em plena residência do Bayerisches Staatschsauspiel (Teatro Municipal de Munique) quando um movimento começou em Leipzig. Começamos a sentir que 150 mil pessoas marchavam em direção ao muro. Nas visitas freqüentes, Daniela Thomas e eu fazíamos amizades com atores do Berliner Ensemble, cujo sonho era tentar escapar no nosso carro (que tinha que estar de volta ao Checkpoint Charlie ás 23h59min em PONTO e atravessar a barreira). Lembro-me, com uma tristeza enorme, de, em 1982 (sete anos da queda), meu pai em pé numa daquelas plataformas de madeira que montaram do lado ocidental pra olhar o lado de lá... O Muro na verdade eram DOIS: era um campo minado, com coelhinhos correndo e um jipe da polícia de Hoenecker patrulhando a fronteira daquela ILHA (Berlim era uma Ilha feita e mantida pelos aliados: you're nowleaving the French quarter, you're now leaving the British quarter). O outro lado era Russo. Stalinista. Prédios horrendos. Karl Marx Allee. Nos mercado não tinha nada. "Mr Gorbachov, tear down this wall", dizia Reagan. E a falta de trigo, somado a tal da "Perestroika", acabou com 70 anos de tirania. E olha hoje: são os mais capitalistas do mundo. Proustianamente falando: estão tentando recuperar o tempo perdido. Não sei mais o que falar sobre isso: sobre as 150  pessoas que morreram tentando escapar. Sobre a Stasi, o serviço secreto da DDR que entregou não sei quantas milhares de pessoas. Vinte anos se passaram e as Alemanhas ainda NÃO se unificaram. Aliás, muitos alemães, tanto de um lado quanto do outro, gostariam de ter o muro de volta. Eu acho isso incrível, mas...

Vamp: Incrível mesmo é perceber que esse passado abominável da humanidade é o futuro com que sonham os “progressistas” latino-americanos. Na Venezuela já falta energia elétrica e água. Em Cuba falta tudo, até papel higiênico... Deste lado bananeiro do continente ainda vivemos no século retrasado. Nos Estados Unidos, que você conhece muito bem, quando um republicano quer ofender o presidente Obama, chama-o de “socialista”. O que é um absurdo, convenhamos. O próprio Marx considerava o Socialismo como um mal: um mal necessário (para Marx), mas um mal. Bom, pessoas que não governam nem a própria vida têm a mania de querer governar a vida dos outros. Estúpidos! Mas falando em Obama – e antes que eu comece a viajar - ele sofreu uma derrota eleitoral bastante significativa recentemente, não é? Você se decepcionou com Obama?

GT: De América Latina eu não entendo nada. Nada mesmo. E não me interessa muito, tenho que confessar. Amo o Brasil, espero que o país decole de vez um dia, mas acho que a corrupção come solta e isso já faz parte do sistema e... Obama: se me decepcionei? Não. A palavra não é essa. Acho que ele deveria ter enfrentado os Republicanos com muito mais garra do que o fez até agora. Hoje, sábado, o Congresso vota na Health Care Bill. Vamos ver. Na questão do Afeganistão, por exemplo, acho que é uma guerra perdida. Não temos mais nada com isso. O General McChrystal quer 70 mil tropas a mais. Não vai adiantar de nada. Serão vidas de jovens americanos jogadas fora. Lições aprendidas no Vietnã e no Iraque. Deixa o Afeganistão ser o que ele quer ser e pronto. O Talibã agora se reagrupa no Paquistão, onde existe a bomba atômica. E? Fazer o quê? Invadir um país - em princípio - nosso aliado? Por que nas regiões tribais o Talibã e a Al Qaeda estão ganhando força? Acho que os USA tem que perder essa mania de invadir países. Num primeiro momento, logo após o 11 de setembro, deveríamos ter entrado com TUDO no Afeganistão. Mas o idiota do Bush desviou a atenção e foi atrás de Saddam Hussein enquanto a própria CIA e NSA e até o Pentágono pediam reforço em Kabul e Tora Bora. Bush, Cheney, Ashkroft e Rumsfeld tinham sua agenda própria (leia-se petróleo, Halliburton e demência) e foram invadir o Iraque. Não havia armas de destruição em massa nenhuma, nada de alianças entre Hussein e Bin Laden (os dois se odeiam), enfim... PERDEMOS O FOCO. Obama: acho que o enorme entusiasmo por CHANGE era que existia (existe ainda) um plano de recolocar a força de trabalho nas highways (rodovias) e pontes - quase todas caindo aos pedaços nos EUA - era parte do Bail Out Plan do início do ano. Nada disso aconteceu. Não estou decepcionado. Acho que Obama tem de ser 100 vezes mais Obama do que tem sido. Afinal, ele é um americano. E todo americano quer o melhor para o seu país. Essa é a nossa Constituição que tanto veneramos. Não, não acho que seja uma derrota significativa perder New Jersey e Virginia. O Corzine não era flor que se cheirasse mesmo. Eu mesmo, como democrata convicto, não gostava do que acontecia do outro lado do rio Hudson.

PS.do Vamp: Ainda sobre Obama, nesta segunda-feira Gerald enviou este adendo: "Esse final de semana foi histórico no que diz respeito a Obama. Em primeiro lugar, enquanto deputado brasileiro procura o primeiro avião para dar o fora de Brasilia e evita trabalhar, o Congresso Americano "ralou" sábado e domingo e deu vitória ao presidente Obama na sua Health Care Reform Bill. Sem precedentes. Todos os Presidentes Democraticos tinham isso como agenda, mas Obama conseguiu isso no seu décimo mês de mandato. Então, aplausos, ou melhor, OVAÇÃO! Agora é com o Senado. Eu mesmo, que estou fora dos EUA, liguei para minha congressista, Carolyn Maloney, do 14 Distrito de NY, e registrei meu apoio, ou seja, pedi que ela votasse a favor. Isso é uma tática comum nos EUA. Liguei direto pro seu escritório em Washington DC."


(Gerald Thomas e Samuel Beckett)

Vamp: Você fez uma feliz parceria com Samuel Beckett. Sobre sua obra (dele), basta dizer que recebeu o Nobel de Literatura em 1969. Eu quero saber do homem Beckett. Como foi seu relacionamento com ele?

GT: Beckett revelava pessimismo com relação à condição humana, mas era um enorme prazer estar com ele. Digo,no início eu tremi de medo de me encontrar com ele porque ali estava o autor cuja obra e vida eu conhecia (talvez mais do que ele mesmo!!!). Como encontrar com tal pessoa? Aliás, vale dizer que ele raramente via pessoas. Vivia numa imensa solidão (escolhida). Como começou a vida tarde e recebeu mais de 100 cartas de rejeição de editores, era natural que tivesse uma certa amargura em relação à raça humana. Então, eu cheguei tarde em sua vida, mas nem por isso não bem vindo. Aliás, muito bem vindo, o que me surpreendeu. E falávamos de tudo. Os encontros duravam umas 3 horas e eram sempre no café do hotel PLM, em frente da sua casa, no Boulevard St. Jacques 38, na parte mais feia de Paris. Ele já tinha ganho o Nobel de literatura no final dos anos 60, já tinha uma vida ótima de direitos autorais porque (somente) "Esperando Godot" e "Fim de Jogo" lhe rendiam uma grana onde ele podia se dar ao luxo de morar melhor. Mas, não. Morava com vista pra um cemitério da Citroen ou outra qualquer. Nos encontros ele me testava: falava um trecho de uma peça ou texto qualquer de sua autoria e eu tinha que – em questão de segundos – vir com o título. E eu não falhava. No mais, Beckett era o típico irlandês em Paris (se é que existe tal coisa). Garrafinha de Irish Malt dentro da manta, andar lento, e, depois de um lento abaixar e levantar de cabeças, ele vinha com perguntas tipo: “Quem está fudendo quem no East Village de NY”?

Vamp: Bem, precisaríamos de uma conversa para falarmos especificamente sobre Beckett. Boa sorte aí em Londres!


GT: Pois é! É tanta coisa. Tanta coisa. No fundo não é nada...

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